Monday, July 10, 2006

Felicidade, Simplicidade, Complexidade

Só a leve esperança, em toda a vida,
Disfarça a pena de viver, mais nada;
Nem é mais a existência, resumida,
Que uma grande esperança malograda.
O eterno sonho da alma desterrada,
Sonho que a traz ansiosa e embevecida,
É uma hora feliz, sempre adiada
E que não chega nunca em toda a vida.
Essa felicidade que supomos,
Árvore milagrosa que sonhamos
Toda arreada de dourados pomos,
Existe, sim: mas nós não a alcançamos
Porque está sempre apenas onde a pomos
E nunca a pomos onde nós estamos.
(Velho Tema I – Vicente de Carvalho)

Outro dia Luiza indagou-me se acho a vida simples. Pego num dia em que eu não estava lá muito prolixo e embasbacado com a pergunta, disse-lhe que não, não achava a vida simples. Disse-me ela, entretanto, que ela sim achava a vida simples e acrescentou que nós é que a complicamos. Mais tarde, quando comentei seu texto sobre a felicidade, utilizei um extrato do soneto da felicidade [velho tema] do Vicente de Carvalho. E Luiza respondeu veloz e sabiamente que o soneto era a prova de que a vida é simples e quem a complica somos nós.

A questão vem me assombrando desde então, o que acabou me levando a dedicar algum tempo e algum fosfato a ela. Parei e pensei se julgam-se as coisas como elas são ou como elas deveriam ser. Julgar a partir da realidade é mais apropriado, a meu ver, pois a virtualidade do mundo das idéias o distancia de qualquer avaliação palpável, tornando o julgamento ainda mais subjetivo e, portanto, menos aplicável.

Respondo agora, Luiza, e certamente o faço com mais firmeza do que então: não acho a vida simples. A julgar pela conclusão a que cheguei sobre como avaliar as coisas, o próprio fato de que complicamos a vida a torna complexa. Digo mais: a vida não poderia ser simples. Se assim fosse, perderia boa parte do seu sentido, porque, se não a complicássemos, seria porque nossa capacidade de abstrair e trabalhar mentalmente os atos e fatos seria significativamente reduzida.

A beleza e o gosto da simplicidade não estão só na sua essência, mas na surpresa de nos depararmos com ela: no perceber que apenas um sorriso pode iluminar uma semana inteira; no entender que a natureza transpõe suas barreiras de forma ágil, esplendorosa e... simples. A simplicidade está nos olhos, está no olhar. No correr, no caminhar, no dormir e no despertar. E, sem os antônimos, os sinônimos perdem seu valor. Ou seja, a simplicidade depende da complexidade para existir enquanto unidade, enquanto excelência.

Continuemos, então, a complicar a vida. E agradeçamos por possuir esse dom. Entretanto, isto não significa abdicar das facilidades que este mesmo dom nos disponibiliza: a de fechar os olhos às vezes e simplesmente viver, sem abstrair, sem questionar; a de parar no acostamento depois da curva para apreciar as árvores e as borboletas que sobrevoam o abismo a nosso lado. Há muito o que aprender quanto à simplicidade e como atingi-la, como enxergá-la. Busquemos, então, respostas para isso. Tentemos. E consigamos!

Saturday, July 08, 2006

O Sentimento

Escrever é um hobby. Pensar, uma necessidade. Existir, uma conseqüência. Amar? Ora peso, ora alívio. Quando me perguntam se estou apaixonado, a resposta é quase sempre não. O apego é perigoso e nada valorizado. O afeto nos deixa expostos, vulneráveis. Sucumbimos dentro do nosso próprio espaço na medida em que o abrimos a outrem. Entretanto, o resultado pode não ser necessariamente a queda. A partir do momento que alguém entra na nossa vida, estamos sujeitos às novidades, às novas e boas experiências que a vida comum traz. É esta a busca: encontrar no outro aquilo que nos conforta, nos envolve, que nos faz sentir bem.

Pergunto-me, hora ou outra, se há algum valor em simplesmente não experimentar essa parte da vida. Porque, quando as coisas dão errado, a vida parece desmoronar, se estatelar em zilhões de pedaços não distinguíveis! E nós parecemos simplesmente não possuir o dom, ou as ferramentas, ou a força para remontá-la. É muito doloroso. E não creio que aquelas pessoas que abraçam as outras áreas da vida [trabalho, religião, etc.] para evitar esta estejam erradas. O importante é encontrar o bem-estar, a felicidade. E ela não precisa ser plena, nem pura, nem máxima. O saldo sendo positivo, não importa se é 10 ou se é 1000. Se as receitas são necessárias para o essencial... o resto é luxo sim. Seguindo nesta apologia, uns moram bem, outros mal; uns falam várias línguas, outros não; uns conseguem obter boa educação, outros não; uns comem bem, outros não; mas, no final, de um jeito ou de outro, estamos todos aqui, no mesmo planeta, respirando o mesmo ar, com as mesmas necessidades vitais. E, se estamos vivos, é porque elas estão todas satisfeitas. Se bem ou se mal, não importa; estão satisfeitas.

Ultimamente, tenho notado que as pessoas não sabem lidar com o envolvimento unilateral: se alguém gosta da gente, abafamos o caso para não ter que lidar com o problema. Porque ele não é nosso. Escondemo-nos no egoísmo do auto-conforto. Na nossa cabeça, resolvemos a questão no momento em que, gentilmente, pulamos fora. Mas nunca dizemos às claras “não quero”. Nossa desculpa é não querer magoar, mas a real razão é que dar um fora em alguém é tremendamente desconfortável. Mas um cheque-mate é, todavia, muito importante para que a pessoa tenha a chance de, a partir da constatação da nossa negação, lidar com a situação de forma direta e incisiva. Sofrendo, se for o caso. Mas o sofrimento fortalece. E a verdade é que só começamos a esquecer alguém no momento em que entendemos e visualizamos que aquela pessoa não nos quer mais da forma como a queremos. Precisamos abrir espaço para que a pessoa afrouxe os laços que tem conosco, sem necessariamente desatá-los. É uma tarefa um tanto complicada, mas não impossível. E não existe fórmula. Como quase tudo que envolve a nós, humanos, aqui também cada caso é um caso...

Sunday, July 02, 2006

As Palavras

To wait.
To be waiting.
To have waited.
To have been waiting.
To be a waiter.

Palavras. Com elas brinco, com elas converso, sobre elas penso e por elas espero. Como, cheiro, processo, vomito e regurgito palavras. Conjugo a maioria dos verbos na primeira pessoa [do singular ou do plural, não importa] e não me considero atrevido nem egocêntrico por isso. Minha questão, na verdade, não é esta. Meu problema – e o que faz de mim problemático – é a espera. Não pelas palavras, nem pelos verbos, porque estes estão sempre em mim [e não, eu não estou querendo colocar-me na posição de alguém que pensa saber tudo], mas por que eles criem vida própria e manifestem-se por si só. Este é o maior problema.

A idéia de servir-lhes minhas palavras, meu dizeres, vem cozinhando em minha cabeça já há algum tempo, e muitas outras construções vieram-me ao pensamento até que eu resolvesse sentar e colocá-los em prática. E quase todos eles vieram e se foram, e eu nada fiz. Porque estava à espera...

Mas não importa. Passado é passado, o presente não existe [enquanto tempo palpável] e do futuro nada sabemos [e pouco prevemos, porque pouco pensamos nele]. E agora que consegui sair de mim mesmo e escrever, declaro abertas, então, minhas opiniões, meus pensamentos, minhas revoltas... meus muros de palavras, a Torre de Babel.